🎧 “About Today”: o momento mais triste da discografia do The National
O The National nunca precisou gritar para ser ouvido. Enquanto outras bandas do indie rock buscaram se destacar pela excentricidade sonora ou estética chamativa, Matt Berninger e sua trupe conquistaram corações ao sussurrar as angústias humanas com precisão cirúrgica. Dentro de uma discografia marcada por melancolia, crises existenciais e silêncios incômodos, “About Today” se destaca como o ponto mais doloroso e vulnerável da banda — e talvez, justamente por isso, o mais belo.
Contexto e a estética da tristeza contida
Lançada originalmente no EP Cherry Tree (2004) e posteriormente reapresentada na trilha do filme Warrior (2011), “About Today” virou hino não-oficial dos corações partidos que preferem o silêncio à raiva, o nó na garganta ao grito.
A canção é o retrato exato do que o The National representa: emoção íntima, específica, mas universal. Não há refrão grudento, nem estrutura explosiva. Apenas uma pergunta simples — “How close am I to losing you?” — repetida como um mantra de quem já sabe a resposta, mas ainda não quer encará-la.
Análise da letra de “About Today”: a lenta implosão de um relacionamento
“Today / You were far away / And I / Didn’t ask you ‘Why?’”
A música já começa com a ausência. Não há briga, não há acusação. Só o silêncio. A distância é física, mas sobretudo emocional. E a inércia de quem sente que deveria perguntar algo… mas não tem mais forças.
“What could I say? / I was far away”
É aqui que a letra se mostra generosa. Não aponta dedos. Há culpa compartilhada. Ambos se afastaram — talvez por comodidade, talvez por cansaço. O afastamento é mútuo, e ainda assim solitário.
“How close am I to losing you?”
Essa é a pergunta que atravessa a canção como um sussurro desesperado. Não é dita com desespero, mas com resignação. A dúvida aqui não é inocente, é temida. Berninger canta como quem está segurando o fim com as duas mãos, mesmo sabendo que vai escorregar.
Letra de “About Today”
🎻 Sonoridade: a beleza da contenção
A versão de estúdio é feita de silêncio. Violões suaves, cordas quase tímidas, um vocal que parece prestes a desmoronar. É a trilha sonora de quem olha fixamente para alguém que ama e percebe que já não o reconhece.
Já as versões ao vivo, como as tocadas em festivais ou no documentário A Skin, A Night, trazem um contraste: o final explode em uma muralha de som — não como catarse, mas como confrontação. É o momento em que a dor é finalmente dita em voz alta. A tensão acumulada deságua, não como alívio, mas como aceitação.
Por que “About Today” ainda nos destrói
“About Today” não é uma música sobre rompimentos. É sobre o momento antes do rompimento. Sobre o olhar perdido, o toque que já não conecta, a vontade de consertar algo que talvez já tenha se quebrado há tempos.
Ela fala com todos que já sentiram uma relação escorrer pelos dedos, sem barulho, sem escândalo — apenas com o peso de tudo o que não foi dito.
E é por isso que, mesmo em meio a uma discografia que flerta com a tristeza o tempo inteiro, essa música dói mais: porque todo mundo, cedo ou tarde, já viveu esse tipo de hoje.