redescobrindo sons - fevereiro/2025

(RE) Descobrindo sons: FEVEREIRO

Mês de fevereiro acabou e isso significa mais uma edição da coluna (Re)Descobrindo Sons. É quase como se fosse uma edição comemorativa de carnaval. Especialmente pelo delicioso samba do Seu Jorge em seu último lançamento, mas você me conhece e sabe que pode esperar algumas surpresas para esse mês. Por exemplo, Mariah Carey ainda está na lista de espera, mas quem ganhou minha atenção por algum motivo desconhecido foi o Guns N’ Roses. Vem comigo para dividirmos um pouco do que foi esse mês. 

O grande evento dos últimos 30 dias foi ressuscitar de vez o projeto Música Viajante. Com as férias (permanentes?) do Audiograma e o Cinema de Buteco não me convencendo de que poderia ser o espaço certo para falar de música, decidi retomar. É uma decisão estratégica com motivos financeiros e profissionais. O mais inteligente teria sido concentrar tudo no Buteco ou mesmo no Listas de Tudo, mas eu não sou lá tão inteligente assim. 

O primeiro passo foi buscar todos os artigos que fiz para o falecido PortalRockinpress. Encontrei textos de 2008 falando do Móveis Coloniais de Acaju, Franz Ferdinand, Muse, dentre outros. Foi uma verdadeira viagem no tempo. Era uma época em que meu trabalho era produzir conteúdo. A quantidade de análises feitas em 2009 me deixou de queixo caído. Logo tudo estará disponível aqui. 

Ainda pretendo varrer meu primeiro blog Não Gosto de Chico. Esse nome é genial, né? A ambiguidade é uma coisa linda. Depois tem os textos do Audiograma e uma cobertura perdida do show do U2 + Franz Ferdinand em 2006. Vamos ter uma base bem legal de coisas, além de novidades com apoio de inteligência artificial. Se tudo der certo, teremos alguns credenciamentos legais para fazer em 2025. 

(Eu já convoquei o John porque não posso repetir a frase clássica de “estou velho demais para essa merda” sozinho)

Decidi ouvir CAJU após a apresentação da Liniker em BH. É um disco lindo. Entendo perfeitamente o motivo da devoção dos fãs no show. É encontrar alívio e conforto nas palavras de quem sabe construir arte. No entanto, por melhor que seja o álbum e a sagacidade de transformar em canções situações do cotidiano, ele é muito tranquilo/feliz. Se fosse tranquilo/triste até ia, mas sou um quase quarentão deprimido prestes a ser demitido. Ou pedir demissão. Não é muito a minha vibe, o que não significa que perderia a oportunidade de ver ao vivo novamente, óbvio. 

Segundo o ChatGPT é assim:

Decidi ouvir Caju depois de ver a Liniker ao vivo em BH. No show, a devoção dos fãs fazia todo sentido: todo mundo entregue, apaixonado, e eu ali, quase chorando e pensando “pô, talvez a vida seja bonita mesmo”. Aí fui ouvir o álbum… e confirmei: de fato, é lindo. Mas também muito tranquilo. Muito feliz. E se tem uma coisa que eu não sei lidar é com felicidade não irônica.

Liniker sabe transformar qualquer cena cotidiana em arte. É talento, é poesia, é um abraço sonoro. Mas, honestamente? Sou um quase-quarentão deprimido prestes a ser demitido (ou pedir demissão, não sei ainda). Se o disco fosse tranquilo e triste, tudo bem. Mas ele é tranquilo e esperançoso. E eu não tenho esse range emocional.

Tem faixa que te faz sentir amado, tem balada cheia de orquestra, tem samba-rock, pagodinho, tem até Lulu Santos e Pabllo Vittar na disco music. O álbum quer te pegar pela mão e dizer: “vem cá, tá tudo bem, respira, toma um chá.” Mas eu tô mais pra “vem cá, enche esse copo e reclama da vida comigo.”

Dito isso, veria ao vivo de novo? Com certeza. Vou continuar ouvindo o álbum? Provavelmente, sim. Só que com moderação – porque doses altas de Caju podem acabar me convencendo de que o amor/alegria existem. E, sinceramente, não sei se tô pronto pra esse tipo de comprometimento.

Ainda sem conseguir ver o documentário sobre o Nickelback, sentei para ouvir o All The Right Reasons, de 2005. Pode falar que é guilty pleasure. Eu realmente gosto de boa parte das canções que estão ali. “Follow you Home” é uma abertura muito acertada para um disco que ainda tem “Animals” e o hit “Photograph”. Só que 20 anos após o lançamento, ainda é consenso que a banda é pura galhofa e vergonha alheia. Deus me livre de perder minha carteirinha de crítico cultural se alguém descobrir que gosto de Nickelback. 

Não sei o que dizer sobre o tesão em de repente ouvir a discografia do Guns. Era criminoso não ter certeza de ter ouvido Appetite for Destruction do começo ao fim. Fiquei com a impressão de nunca ter feito isso antes (apesar de reconhecer “Think About You”). Talvez seja merecedor de um lugar na lista dos melhores discos de estreia de uma banda. Das 12 canções, 9 são clássicos da discografia e faixas muito populares. Gosto particularmente da história do Axl transando com uma groupie e registrando todos os sons para usar no fundo de “Rocket Queen”. Será que isso seria aceito nos dias de hoje? 

Lançado em 1987, Appetite for Destruction não é só um disco, é um tapa na cara, um chute na porta e um convite pra uma noite de más decisões – tudo ao mesmo tempo. A estreia do Guns N’ Roses foi tão explosiva que até hoje parece que foi gravada dentro de um bar enfumaçado, com todo mundo bêbado, suado e prestes a brigar (ou se beijar, depende do nível da tequila).

Tem Welcome to the Jungle, que basicamente te recebe no inferno de Los Angeles. Sweet Child O’ Mine, que foi de balada romântica a hino obrigatório de churrascos. Paradise City, que parece feita pra ser berrada em estádios (e na sala da sua casa depois de umas cervejas). E, claro, muita guitarra do Slash e gritos do Axl Rose dignos de alguém que pisa descalço num Lego.

Se você nunca ouviu esse álbum inteiro, parabéns: você tem um grande dia pela frente. Se já ouviu, coloca de novo e lembra por que o rock já foi tão perigoso e divertido.

Pena que em 1991, quando a megalomania de Axl permitiu um lançamento duplo com Use Your Illusion, o grunge já havia mostrado como ser ótimo sem precisar parecer um babaca baderneiro. Longe do resultado do segundo (e terceiro?) ser ruim, sabe? O primeiro volume é bem superior, apesar da minha favorita “You Could be Mine” aparecer somente no segundo. Mas é uma coleção de sucessos de respeito. Esse eu tinha certeza de nunca ter ouvido inteiro antes. 

Se Appetite for Destruction foi um tapa na cara, Use Your Illusion I é aquele álbum que o Guns N’ Roses lançou quando percebeu que podia fazer música além de quebrar tudo. Ainda tem rock sujo e agressivo? Sim. Mas agora tem piano, tem balada, tem orquestra, tem Axl Rose bancando o compositor clássico e achando que é o novo Elton John (spoiler: às vezes funciona).

O disco abre com Right Next Door to Hell, que é basicamente o Guns tentando provar que ainda é uma banda de rua. Mas aí vem Don’t Cry, que faz qualquer roqueiro durão lembrar do primeiro pé na bunda. E então temos November Rain, que não é só uma música – é uma experiência cinematográfica de quase 9 minutos que vem com solo de guitarra obrigatório para todo guitarrista iniciante e um clipe que ninguém entende até hoje.

Tem também Live and Let Die, cover que Paul McCartney deve ter ouvido e pensado “que diabos aconteceu aqui?”. Bad Obsession, que tem gaitinha pra dar aquele charme de boteco. E Coma, que dura mais de 10 minutos e prova que o Guns não tinha medo de exagero.

Use Your Illusion I é a fase do Guns onde eles ainda eram rebeldes, mas começaram a usar ternos e sonhar alto. Não é tão caótico quanto Appetite, mas é um espetáculo à parte – e o começo de uma era onde o Axl descobriu que podia se estender muito mais do que o necessário.

A escolha de incluir releituras de Paul McCartney e Bob Dylan (“Live and Let Die” e “Knocking on heavens Door”) é interessante e fortalece a unidade da obra. Afinal, cada parte ganhou sua regravação. Existem outros elementos parecidos conectando a parte I e II, mas a principal é “Don’t Cry”. Prefiro a gravação do Use Your Illusion I.

Se Use Your Illusion I foi o Guns N’ Roses mostrando que sabia usar um piano e orquestra, Use Your Illusion II foi quando eles disseram: “Quer saber? Vamos fazer um álbum ainda maior, mais longo e mais dramático. E foda-se.”

Tem balada? Tem. Tem rock porrada? Tem. Tem cover de Bob Dylan que ficou melhor que o original? ÓBVIO QUE TEM.

O disco abre com Civil War, que começa com um discurso do Cool Hand Luke e termina com você de punho cerrado contra todas as injustiças do mundo. 14 Years é Izzy Stradlin cantando, o que já deixa tudo com cara de “deveria ter dado mais atenção a esse cara”. Yesterdays é um desabafo nostálgico e melancólico, e Knockin’ on Heaven’s Door é aquela versão que fez todo mundo esquecer que essa música era do Bob Dylan.

Mas nada, absolutamente NADA, supera Estranged – que é tipo November Rain, só que com o triplo de crise existencial e um clipe que envolve golfinhos CGI (não pergunte, apenas aceite).

E ainda tem You Could Be Mine, que foi parar na trilha de O Exterminador do Futuro 2, porque nada representa melhor essa música do que Arnold Schwarzenegger querendo destruir tudo.

Use Your Illusion II é megalomaníaco, exagerado, gigante e um dos últimos momentos de glória do Guns antes do caos tomar conta. Mas, sinceramente? Se for pra cair, que seja tocando solos épicos e lançando músicas de 9 minutos.

Antes de encerrar, o meu amigo Fernando deixou uma dica insana de uma banda de rock muçulmana. Nunca imaginei essa combinação. Fica ainda melhor. Sabe o nome do grupo? Prostitute. Escuta aí e diga o que achou! Eu me amarrei. Na falta de ouvir coisas novas, foi uma excelente opção para ouvir, curtir e sorrir com a certeza que ainda existe coisa boa sendo feita (independente do risco de nunca mais ouvir as músicas dos caras).

Voltaremos mês que vem! 

Discos

Fevereiro

CAJU – Liniker

All The Right Reasons – Nickelback 

Appetite for Destruction – Guns N’ Roses 

Use Your Illusion I – Guns N’ Roses 

Use Your Illusion II – Guns N’ Roses 

 

Janeiro

Pills n Thrills and Bellyaches – Happy Mondays

Lucifer on the Sofa – Spoon

Nebraska – Bruce Springsteen

Born in U.S.A. – Bruce Springsteen

Titanomaquia – Titãs

Unknown Pleasures – Joy Division