essa me lembra você offspring

Essa me lembra você: “(Can’t Get My) Head Around You” – The Offspring

O ano era 2004. Eu era um jovem estudante na faculdade de Direito vivendo os dramas de uma escolha profissional de livre e espontânea pressão, ver seu relacionamento à distância chegando ao fim e prestes a encarar meu primeiro show internacional fora de Belo Horizonte.

A ideia nem foi minha, para falar a verdade. Um estudante maluco do curso de marketing me puxou para conversar um dia e começamos a trocar ideia. Um maluco atrai o outro. É um tipo de lei universal, que se potencializa na faculdade. Entre rolês aleatórios em festas, roubar cavaletes no meio da rua, fugir da polícia, fugir de cracudo e flertes sem sucesso com garotas, esse cara me perguntou se eu não topava viajar para o Rio de Janeiro para ver o Offspring.

Não queria mostrar minha dependência familiar e falar “minha mãe não deixa”. Quando você está na faculdade, tudo que você não precisa fazer é revelar a verdade para as outras pessoas. Está todo mundo vivendo um personagem. Inclusive, nos anos 2000, antes de Instagram, a vida social acontecia em carne e osso. Até dava para mentir ou disfarçar, mas a chance da casa cair era imensa. No entanto, respondi que gostava da ideia e iria tentar.

Conversei com a minha amiga Bruna e ela tratou de resolver a situação criando um “conselho de mães”. É incrível a capacidade das mulheres, mesmo tão jovens, como o caso da Bruna naquela época, conseguirem resolver situações impossíveis. O plano tinha tudo para dar certo, já que em setembro ela tinha conseguido vir para BH assistir ao show do Los Hermanos no Pop Rock Brasil. Bastou um telefonema e as mães se acertaram.

Fui todo feliz avisar meu amigo mais louco que eu. “Vai rolar, cara.” Combinamos de comprar a passagem no mesmo ônibus e ele contou que teríamos a companhia de duas pessoas: uma super fã alucinada de Offspring e o seu primo. Ela é fã da banda até hoje, diga-se de passagem. Provavelmente viu mais shows do Offspring do que o próprio Dexter, sei lá.

Aproveitei aquela viagem para tentar “salvar” meu relacionamento virtual. Porém poucos dias antes de termos nosso primeiro encontro, o caldo azedou para o meu lado. A carioca me trocou por um outro carioca. Penso que fui burro de querer guardar segredo, sendo que poderia ter avisado com antecedência, mas tenho uma mania estúpida de fazer surpresa. Nunca deu certo. Ela se recusou a comprar ingresso antes de saber que eu iria e não teve muito ânimo depois de descobrir – o que não significou cancelamento na pegação. Eram anos de tesão virtual acumulados.

Só que essa não é uma edição do Essa Me Lembra Você focada em relacionamentos que deram certo ou errado.

O que realmente faz “(Can’t Get My) Head Around You” ser uma lembrança especial foi um detalhe no final do show. No meio da roda, com todo mundo se esmurrando e eu praticamente sendo arremessado de um lado para o outro, um rapaz gritou: “perdi meu relógio”. Se fosse nos dias atuais, as pessoas dariam o soco na cara dele e xingariam: “que tipo de idiota anda com relógio em um show de punk rock? Quantos anos você tem, seu cringe?”, mas naquele dia, naquele momento, a magia aconteceu. O pessoal montou uma roda para abrir espaço pro cara achar o relógio. E o Offspring quebrando o pau tocando Ramones.

Na sequência veio “(Can’t Get My) Head Around You”. Me dá arrepio só de lembrar. É tipo a porra da sirene no show do Rage Against the Machine e aquele mar de gente suada chorando de emoção antes de pular como se não houvesse amanhã. Existem dois momentos de pausa na música. Ambos são interrompidos como se fossem ondas gigantes quebrando na sua cabeça. Você praticamente enxerga a calmaria antes da destruição. Ter presenciado isso ao vivo (nesse dia e vários outros shows do Offpring depois) sempre reforça essa lembrança.

Até me faz esquecer do frio amaldiçoado que nós passamos na Barra depois do show. Todo mundo molhado de suor e aquele vento de Curitiba fazendo escala no Rio de Janeiro. Mas valeu a pena demais. O Offspring marcou o começo de uma longa, e interminável, jornada de caçador de shows que já tem mais de 20 anos de estrada.